Respondendo à Leandra Leal
Leandra Leal é uma unanimidade. Excelente atriz, produtora cultural e empreendedora. É um pedaço do Brasil que nunca nos deu vergonha e sempre foi envolvida com o melhor que a cultura brasileira pode oferecer: de papéis marcantes em novelas até filmes que fazem parte de nossa história. Você pode não gostar de seu posicionamento político, mas assim como Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil (que tem visões de mundo diferentes entre si) ela é um Brasil que sempre deu muito mais orgulho do que vergonha.
O questionamento da atriz no Altas Horas costuma repercutir por todo mundo que tenta começar um diálogo sobre o momento do Brasil. Como pudemos eleger Bolsonaro? Em primeiro lugar, a pergunta é correta independente se quem faz votou em Fernando Haddad, “anulou” ou anulou de verdade. Há uma espiral de níveis de culpa que recai sobre todos nós que vivemos neste país. De alguma forma, somos todos responsáveis mas é indispensável que a gente entenda que uns são muito mais do que outros. Paguem seus boletos.
Obviamente, quem votou em Fernando Haddad é muito menos responsável do que quem anulou voto. A partir daí, é preciso entender o que é o Brasil hoje. Um país onde a informação circula em bolhas, a TV aberta é forte mas a rede Globo tem muito menos alcance. Há quem tenha anulado ou até votado em Bolsonaro que, simplesmente, desconhecia o que estava em disputa. Gente social e intelectualmente humilde manipulada por forças como os conglomerados neopentescostais, pequenos e médios grupos midiáticos financiados por grupos econômicos e até pelas transmissões da Rede Record, que não teve nenhum pudor em abraçar o bolsonarismo em 2018.
Mas, convenhamos, nem todo mundo que anulou ou votou em Bolsonaro era assim. São a essas pessoas que o questionamento de Leandra Leal deve ser feito. Muito embora a resposta me pareça óbvia.
Para a classe média brasileira, o voto em 2018 não era uma questão de vida e morte como era para índios, moradores de comunidades — aqueles em que Bolsonaro prometeu jogar bombas para achar traficantes — ou pessoas LGBTQ+. Toda classe média tinha conhecimento que estes e outros alvos do bolsonarismo correriam risco de vida.
Mas decidiram arriscar. Afinal, não era a vida deles em jogo.
Essa é a resposta dura que Leandra Leal e o Brasil não merecia ouvir: Parte dos brasileiros permitiu que Bolsonaro fosse eleito porque acreditava que seus privilégios sociais o manteriam a salvo das piores consequências do que estava por vir.
Morte sempre foi um compromisso de Jair Bolsonaro. A pandemia de covid-19 apenas garantiu as melhores condições para que o presidente eleito cumprisse sua meta. Foi um karma que democratizou todas as consequências, garantindo que mesmo que os maiores afetados fossem pobres, LGBTQ+, população indígena e carcerária… A elite também sangraria desta vez.
Uma lição dura para o país. E fica a pergunta: será que essa classe média, ressentida e sem empatia que permitiu Bolsonaro, aprendeu alguma coisa?